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terça-feira, 25 de dezembro de 2012

O sobrecu






Marcos Eugênio

Dia 24 de dezembro, véspera de Natal, é dia da tão celebrada ceia natalina, uma tradição cultuada praticamente em todo o mundo.

No pequeno lugarejo denominado feliznópolis,  como é bastante comum nesse dia (24), todos acordam animados e num corre-corre alucinado buscam organizar sua ceia, comprar as últimas lembranças para a confraternização em Cristo, apesar de muitos não lembrarem do menino Jesus, dando grande ênfase na troca de presentes.

O peru da ceia natalina não pode faltar nas famílias mais tradicionais. As vizinhas discutem receitas, falam de parentes que estão chegando para o momento tão importante do ano e já vislumbram desejos de um próximo ano de muitas realizações.

Preocupadas com o peru, já descongelado e temperado, pronto para ir ao forno, esse importante símbolo da mesa natalina, tornou-se elemento principal de uma peleja entre as senhoras Eulina e Jacira. Depois de percorrer o comércio em busca de quem assasse a ave, enfim descobriram uma panificadora que atendia a esse tipo de pedido, por alguns R$, das mulheres que temiam colocar por água abaixo sua ceia de Natal, caso não conseguisse assá-lo bem em sua fogão de casa.

As duas combinaram e foram deixar seus perus numa mesma panificadora para no final da tarde ir buscá-los.

Dito e feito. Os perus ficaram bem dourados e deixaram-nas bastantes felizes.: “Pronto, o principal da ceia está pronto para ser servido”, pensavam. Enquanto Dona Eulina estava com a casa cheia de filhos e netos, Dona Jacira estava pronta pra viajar para uma cidade vizinha, a poucos quilômetros, para a casa de su filha, algo que ela fazia já há cinco anos, depois que Flávia casara com um funcionário público e tinha sido transferido de Feliznópolis. 

A ceia estava prestes a ser servida. Alguns genros de Dona Eulina já tomavam uns drinques e falavam dos últimos acontecimentos no pequeno lugarejo, especialmente do prefeito eleito este ano, e o que esperavam de sua administração.

Por outro lado Dona Jacira já havia se deslocado no velho Chevette com seu esposo Eraldo em direção à casa de Flávia. Até ai nada de anormal, até que Dona Eulina notou um detalhe que a deixou atônita. Haviam trocado os perus na panificadora. Quando ela preparou o peru para temperá-lo, havia cortado o sobrecu, já que ninguém ali gostava dessa parte do animal. Foi um deus nos acuda, já que a vizinha não estava mais em casa fazia mais de meia hora e já deveria esta sentada à mesa saboreando o peru de Dona Eulina. 

Houve um grande alvoroço e todos diziam que tanto fazia o peru estar ou não com o sobrecu, mas Dona Eulina não queria saber de papo e tratou logo de chamar alguém que fosse com ela até a casa da Flávia para destrocar a ave. A muito contra-gosto um dos genros, após de Amália, filha de Eulina, pegou a moto e foi com esta, levando o peru de Dona Jacira, muito bem empacotado ao destino. “Vamos mais rápido”, dizia agoniada Eulina.

Quando chegaram à residência de Flávia, o jantar já começava a ser servido. Eulina gritou, logo que entrou na casa: “Parem, não cortem esse peru”. Todos pararam e ficaram mudos, sem qualquer reação.

Dona Eulina, após respirar fundo e meio que envergonhada pela cena proporcionada por ela, chamou a amiga reservadamente e começou a falar sobre o episódio, que os perus haviam sido trocados, já que o dela não tinha mais o sobrecu. “Mulher, quando a gente acertou levar nossos perus para a mesma padaria, de imediato retirei o sobrecu dele para poder saber qual era o meu”. Sua amiga Jacira respondeu-lhe de pronto: “Eulina, minha filha, juro que não tinha notado ainda. Com certeza iria perceber quando fosse cortar o peru, já que não jogaria fora o sobrecu do meu marido, pois é a parte do bicho que ele mais gosta”.

 

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